sábado, agosto 23, 2008

Uma edição para mostrar que continuávamos em fascismo (e guerra colonial)

O mais sucintamente que me for possível:

1. Enquanto decorria a campanha eleitoral de 1969, aquelas em que se pretendia mostrar que o marcelismo era o pós-salazarismo (ou, até, o anti-salazarismo), resolvi aproveitar a minha participação como candidato em Leiria para, documentalmente, demonstrar que o fascismo continuava, que a continuidade prevalecia sobre a renovação, que as eleições eram a "batotice" habitual.

2. Fui juntando documentação, nomeadamente as folhas (diárias) de informação que se distribuiam - como possível - pela população, todas as tropelias de que éramos alvo, e tinha a intenção de, com os resultados, publicar o livro em "tempo útil", ou seja, logo após as eleições, no começo de Novembro.

3. Para esse objectivo, entreguei o original numa tipografia de alguém com quem tivera um excelente relacionamento durante a campanha, e pedi-lhe a maior brevidade.

4. Dado um inexplicável atraso no recebimento de provas para rever e um silêncio ainda menos explicável, procurei o dono da tipografia - que era fora de Lisboa - e este, muito pesaroso, disse-me ter lido o original, por ser meu, e que, face ao que lera, resolvera não o publicar... porque não podia correr riscos, porque investira tudo naquela tipografia, que dela dependia a vida familiar, e etc., etc.

5. Tentei explicar-lhe que se alguém corria riscos era o autor e a editora, e não a tipografia, mas foi inútil (e doloroso), e voltei para Lisboa com o original.

6. Imediatamente o meti numa segunda tipografia, com que a Prelo trabalhava habitualmente, e pedi a maior urgência.

7. Entretanto, o dono da primeira tipografia escreveu-me uma carta de muito pesar, cheia de má(s) consciências(s), em que reiterava as justificações, e me colocava nos píncaros do heroísmo e a si próprio chamava cobarde e outras coisas pouco simpáticas.

8. Tive, então, uma das ideias mais estúpidas da minha já longa vida (em que não faltam outras...): juntar às provas que tinha em mãos a carta, como posfácio demonstrativo do ambiente em que se vivia e, ao mesmo tempo, assim justificar o atraso da saída do livro relativamente aos propósitos iniciais.

9. Aconteceu o que deveria ter previsto: o responsável da segunda tipografia, se não lera o original, leu o dito posfácio e disse-me, peremptório, que não iria completar a feitura do livro.

10. Seguiram-se laboriosas negociações, em que o consegui convencer a acabar o trabalho, embora, evidentemente, tivesse de... desistir de lhe juntar um posfácio.

11. Assim, o livro veio a terminar o seu calvário, e saíu em Abril de 1970.

12. Mas foi logo cruxificado, isto é, apreendido!

13. Caso para dizer, tal e qual nas demonstrações matemáticas: como queria demonstrar, o fascismo continuava!

4 comentários:

Maria disse...

Só quem não viveu a época é que pode dizer que o marcelo não era tão mau assim, até explicava/justificava tudo bem explicadinho/justificadinho nas famosas conversas em família, que até tentou resolver o problema da guerra colonial, sei lá...
Já disse por aqui, ou por lá, que os senhores do capital puderam ir de férias, descansados, depois dele ter sido nomeado. Porque seria?
Fico por aqui (para não estragar a brincadeira...) :)))

samuel disse...

Mas lá que andou uma data de gente muito contentinha com a "primavera", lá isso andou!...

**Viver a Alma** disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
**Viver a Alma** disse...

viva!
Bom...espero não cometer uma valente derrapagem.
Vamos lá então rebobinar a fita. Estàvamos em 1969:
MDP-CDE,certo?
Andava eu averta altura a distribuir esses votos, para as eleições que estavam á porta e quando saí do antigo café(?) ao lado do cinema Eden - ignorando que fosse o ponto de enontro da Pide - levaram-me "dentro", para a esquadra junto ao Teatro de D. MAria II.
Bom...mas antes disso, estes nomes dizem-lhe alguma coisa?
- Leon de Castro, Joaquim Campino, Carlos Campino(que faleceu anos depois num desastre de automóvel), São MAtos,(?), Almeida Henriques,etc. Foi nessa altura e com esta gente, - se é o mesmo Homem, escritor e esquerdista na altura....economista(?) - que o conheci!
Bom...só sei que me foi tirar da esquadra, onde permaneci desde o meio-dia até á noite - mas como era menor, na altura...safei-me!
Depois voltámos a vermo-nos já na Comunicação social...seria talvez Adjunto ou Assessor de alguém daquela pasta...não me lembro bem...passei por tantos homens - salvo seja!
Sugiro que vá ao meu blog - muito diferente do contexto do seu, aviso já, porque estou "noutra dimensão"(?)e veja se ainda me reconhece?! Essa foto foi tirada ainda não há 1 ano! Agora tenho o cabelo mais comprido...mas se lembrar....uma certa vez a companhia de ballet onde eu estava, demos um espectáculo, para todos os da Comunicação Social....no MAria Matos - diziam até que um dia ainda haviam de ver-me a "ir a despacho de pastas na mão, mas em pontas!!!"
Se é que é o mesmo Sergio Ribeiro! Aqui não vajo foto sua!
Se não for...tive muito gosto em vir até aqui...na mesma!
Até breve
MAriz