segunda-feira, julho 14, 2008

Uma sala magenta e uma pistola na capa

Todos os livros têm páginas. Este, A SALA MAGENTA, de Mário de Carvalho, tem 175.
Sem que me entusiasme, gosto da escrita de Mário de Carvalho, e do que conta. Posso não gostar tanto dos personagens, mas que se há-de fazer? Começaram por ser do autor, e ele assim lhes deu vida.
Se todos os livros têm páginas, e este tem 175, deste ficaram-me duas com trechos em registo:
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1. a descrição de como “À desolação de saber Maria Alfreda abandonada sob a rígida ordenação de montículos, acrescia o desconforto da promiscuidade: todos tão perto, tão chegados, tão apertados, corpo contra corpo. Quem seria aquela gente que enfileirava agora, quase ombro com ombro, com Maria Alfreda e que trouxera para aquele recinto as passadas, os rumores, o cansaço desatento das suas famílias, dos seus conhecimentos? Sempre tão discreta, a reclamar espaço, a defender-se das multidões e dos grupos, aí estava agora Maria Alfreda, alinhada a jeito, a compor o enquadramento, a partilhar o repouso, na indistinção duma formatura.”
2.- e, antes (embora na página a seguir), “Que queria Gustavo de Maria Alfreda? Que ela, enfim, parasse, que o escolhesse de vez, contra um passado preenchido por outras presenças, que supunha todas cativantes e perturbadoras, e também contra um presente desassossegado por interrupções, instabilidade, sinais de alerta e de perigo.”

3 comentários:

Justine disse...

Estas, ou muitas outras páginas deste livro escrito num português admirável.
Desencantado, desistente? Ou tão só cínico, sendo o cinismo um modo de denúncia?
Eu acrescentei alguma coisa à minha vida, com a leitura de "A sala magenta"

Anônimo disse...

Não partilho do teu entusiasmo. Admirável... acho demais. Gosto da sua escrita. E pronto.
Quanto ao desencanto, à desistência, ao cininismo como modo de denúncia, isso são outros milreis.
Mas haverá algum livro que não acrescente alguma coisa à nossa vida? Quanto mais não seja a necessidade de começar imediatamente outro...
No sentido em que tu o dizes, parece-me que o livro tem a virtude de ser... contemporâneo e, por isso, fazer "pontes" para vivências de contemporâneas/os leitores/as.
É agradável conversar assim.
Beijos

linhadovouga disse...

Gosto bastante do Mário de Carvalho, da sua ironia e do seu domínio do português. Admirável ou não, é um daqueles autores que me faz pensar três coisas no final da leitura de um dos seus livros:
1. Que aquilo que li devia ser escrito exactamente assim
2.Que há quem tenha estórias interessantes para contar e o faça num português impecável
3. O bom que é que existam livros assim