O escritor, ou seja, o homem com 71 anos, mais ano menos ano, diz que (e o leitor, ou seja, este homem com pouco mais - por agora... - de 71 anos, transcreve ou sobre-escreve):
"Era agora avassaladora a vontade de cortar com a ilusão vã e tola da regeneração, ir buscar o carro à garagem da esquina e partir a toda a velocidade em direcção ao norte e à minha casa, onde podia rapidamente voltar a pôr as ideias no seu lugar, sob as exigências transformadoras da ficção em prosa, em que não há espaço para os sonhos doces. O que não tens não te faz falta - tens setenta e um anos, e isso é que conta. Os dias de orgulho e afirmação pessoal já lá vão. Pensar de outro modo é ridículo." (pág. 48)
Depois, como que a procurar auto-convencer-se, desenvolve, ou desenrola, ou glosa, o tema (obsessivo?!) até à página seguinte (49)
"Como alguém que noutros tempos fora intensamente receptivo (e interventivo, acrescenta o leitor por sua conta e seu risco próprios) e na última década se tinha transformado num discreto solitário, tinha perdido o hábito de ceder a qualquer impulso que me atravessasse as terminações nervosas,"
e termina a elucubração comprovando, contraditoriamente, que nunca a saída de cena é definitiva, nem mesmo quando o ridículo levaria a obrigar a que definitiva se tornasse, enquanto o homem se mantiver, em pouco que seja do seu corpo, fiel ao que sempre foi, pelo que
"e no entanto nos últimos poucos dias tinha chegado àquela que talvez viesse a revelar-se a mais insensata das resoluções repentinas que alguma vez tinha tomado".
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